16/12/2016

BEIJOS DO GORDO





Termina hoje o já "lendário" Programa do Jô, um talk show que estabeleceu um novo formato aqui no Brasil. Desde o final dos anos 80, quando estreou no SBT, mudou pouco, mas despertou todo tipo de reação, de cultuado a ridicularizado, de entretenimento cabeça a besteirol descartável. Apesar da produção requintada, os méritos todos sempre estiveram com Jô Soares. O programa era dele e era ele. Ele que conduziu milhares de conversas. Levantou centenas de carreiras, e também foi muito criticado por sua vaidade; constantemente parecia querer usar o entrevistado de escada para suas (requentadas) piadas. Porém não se pode negar o mérito de alguém que fazia três entrevistas por dia, trazendo desde personagens do povão até a alta intelectualidade.

Se a soberba intelectual do Jô por vezes gritava, hoje os talk shows são entregues à celebração da ignorância. Não temos ninguém com a gama de repertório para substitui-lo (nem parece mais haver espaço para isso). Bem ou mal, era o espaço mais democrático para a literatura (e as artes em geral) na TV aberta.

Hoje pipocaram entre meus amigos do Facebook fotos, lembranças e histórias de suas entrevistas no Programa do Jô. Foi um divisor na carreira de muitos e não posso negar que tenha sido na minha. Estive lá quatro vezes, além de uma reprise. E agora me pego lembrando de tantas histórias de bastidores…

VAMOS AOS PODRES!!!


- Quando estreou, no final dos anos 80, minha mãe era uma grande fã. Chegou a comprar uma televisãozinha PB de dial (eternizada em BIOFOBIA) para assistir as entrevistas na cama. Lá por 2011, 2012, quando ela tinha publicado seus primeiros livros, ela foi convidada, mas recusou. Dona Elisa é uma escritora reservada.

- A primeira vez que eu estive lá, na verdade, foi provavelmente 96 ou 97, como plateia, assistindo com minha faculdade.

- Fui gongado duas vezes antes de participar. A primeira vez foi em 2003, logo após lançar meu primeiro livro, a segunda foi em 2005, lançando Feriado de Mim Mesmo. Funcionava assim: a produção ligava e fazia uma pré-entrevista para ver se rendia para o programa. Duas vezes disseram sem rodeios: não rende, não tem graça - a produção nunca foi das mais simpáticas comigo. Uma semana depois dessa segunda dispensa, em 2005, ligaram de volta dizendo que o Jô havia insistido para fazer. Foi assim que rolou da primeira vez.

- Essa primeira entrevista, talvez por eu ser novidade, talvez por ser um belo jovem varão, talvez pelo programa estar mais em alta na época, foi um verdadeiro divisor de águas para mim. No dia seguinte eu estava recebendo ligações, convites e xingamentos. Na série de reprises do programa que a Globo exibia no ano seguinte, fui a primeira entrevista reprisada.



- Voltei em 2006, com o lançamento de Mastigando Humanos. Foi minha pior entrevista lá. Entrei depois de dois blocos loooooooongos da Suzana Vieira apresentando seu novo marido, que na época era aquele policial cafajeste que já morreu. Entrei tarde pra caralho, a conversa foi curta e o Jô basicamente queria repetir a entrevista que havia feito comigo no ano anterior. Por sorte, essa é a única das minhas participações no programa que não pode ser encontrada no Youtube. (Eu mesmo também não tenho nenhum registro).

Isso é tudo o que tenho de registro dessa segunda entrevista. 

- Falando em Suzana Vieira, os 5 minutos que estive nos bastidores com ela, destratando toda a produção, foram suficientes para considerá-la a pior pessoa do mundo.

Com Ale Matos, esperando para entrar. 

- Minha terceira entrevista foi para o lançamento de O Prédio, o Tédio e o Menino Cego , em 2009. Foi uma entrevista suave, sem grandes percalços, mas sem grandes repercussões.

Mas eu tava bonitinho, né?

- A última vez que estive lá foi em 2011, no lançamento de Pornofantasma. A entrevista estava marcada para semanas na frente, mas anteciparam num dia de tempestade e alagamento em São Paulo, com aeroporto fechado e muitos convidados não conseguindo chegar ao estúdio. Me ligaram em cima da hora, não pude nem me depilar... Talvez por isso senti o Jô meio despreparado, talvez um pouco velhinho, meio pescando. Mas quando terminou a entrevista ele disse: "Você sabe que gosto muito de você, né?" Fiquei enternecido.



- Sem dúvida o programa lançou meu nome para um grande público, mas não sei se refletiu muito na venda dos livros. As entrevistas também me venderam mais como um personagem bizarro - ex-escritor de disk sexo, performer de auto-mutilação, barman de "prostíbulo gay"- do que como escritor. Ainda assim, tenho de reconhecer que sempre deram espaço para eu falar dos livros, ainda que não tenha sido o que mais atraiu a audiência...


- Nunca houve nenhum corte em nenhuma das entrevistas. O que eu falei foi integralmente no ar, como se fosse ao vivo (embora as entrevistas todas fossem gravadas durantes as tardes de segunda, terça, quarta e quinta).



- Meu contato com o Jô também foi quase integralmente só o que foi ao ar, tirando alguns segundos pós-entrevista de "obrigado, volte sempre". Ele não costumava receber convidados no camarim, você só o vê quando vai ao estúdio. Fora isso, eu o encontrei uma vez numa galeria de arte e uma vez no show do Rufus, mas foram só rápidos cumprimentos.

- Os acompanhantes que foram comigo nessas quatro entrevistas foram: 1a) Daniel Luciancencov, meu namorado na época e fotógrafo da capa do Feriado de Mim Mesmo. 2a) Marco Túlio, ilustrador do Mastigando Humanos, e minha amiga escritora Cris Lisbôa. 3a) Alexandre Matos, ilustrador de vários dos meus livros. Na 4a vez fui sozinho.


- Participei de  vários outros programas (Galisteu, Monique Evans, Peréio, Metrópolis, Edney Silvestre, Dr. Kurtzman), mas nunca foi um EVENTO como esses e nunca teve um décimo da repercussão.

- E não, nunca paguei nada para participar do programa, obviamente. Muito menos as editoras, que mal investem nos convites das noites de autógrafo.

- Claro que não consigo assistir aos vídeos das entrevistas. Não me arrependo de nada, mas é outro eu lá, fico constrangido.

Termino orgulhoso de ter feito parte, agradecido ao querido Jô, melancólico por saber que ficou no passado... O que será hoje dos belos jovens novos existencialistas bizarros?

Bem, provavelmente é a vez do Youtube.

Beijo no gordo. 



01/12/2016

QUE MERDA DE ANO...


Essa foi minha grande viagem de 2016.

Não deu para ser feliz em 2016...


Em Florianópolis, em maio. 

Ano passado muita gente já reclamava da crise, mas consegui surfar razoavelmente, viajei para a Armênia, Europa, fechei alguns projetos bacanas, realizei uma dúzia de eventos que mantiveram as contas sob controle.

A virada até que foi tranquila, só eu e Murilo na casa de campo da minha mãe.
Bowie morreu logo no começo, e escrevi um conto na Ilustríssima inspirado nele. Mas foram poucas colaborações na Folha este ano. 

Este ano começou com muito trabalho e pouco dinheiro, terminou com pouco trabalho e nada de dinheiro. Pouquíssimas viagens; não deu para conhecer nenhum país novo, nenhum país velho. Passei meses, meses, literalmente trancado em casa. Enquanto isso, recebia as piores notícias lá de fora: Golpe, Dória, Trump, uma crise e um conservadorismo crescentes que tornam as perspectivas futuras nada animadoras.

Carnaval em SP mesmo, em companhia de grandes autores: Joca Terron, Rodrigo Lacerda, Ivam Marques, Lourenço e Lucimar Mutarelli, Ivana Arruda Leite, Xico Sá, Ronaldo Bresane, Tati Bernardi, Marcelino Freire, Andrea Del Fuego, Adilson Miguel e Noemi Jaffe. 

Meu aniversário este ano foi low-profile. Demos de turistas por São Paulo, fomos ao zoológico e ao (restaurante armênio) Casa Garabed. 

O namoro foi tranquilo, suave como sempre; no segundo semestre Murilo se mudou para cá; agora se prepara para abrir um restaurante no litoral, então está com um pé em cada lugar. Acho que nosso companheirismo que me fez suportar, ainda que os dois estivessem na merda, cada pequena conquista de um servia para ajudar o casal. Por sorte não somos daqueles, tão típicos, que afundam um ao outro... Ao menos, não ainda.

A nova família brasileira. 

E teve também a Gaia, minha nova coelha. Desde a morte da Asda, queria adotar. Consegui no começo do ano. Gaia veio arisca, distante, educada; tornou-se das coelhas mais carinhosas... e abusada. Destruiu metade da casa, mas impediu que eu me destruísse. Carente ao extremo, não larga um segundo do meu pé, e se não dou atenção vai destruir o sofá, vai comer os fios do computador. Não tem jeito, já é a dona da casa.



Fora o coelho, fora o amor... só o Playstation salva. Devo muito da minha sanidade ao Monster Hunter Freedom Unite, jogo antiguinho para o PSP. Baixei sabendo que era das coisas mais viciantes, pensando em preencher o tempo enquanto esperava as editoras ressuscitarem, ventos moverem moinhos; consegui queimar dias e dias em que eu poderia estar lendo, poderia estar trabalhando, poderia estar ajudando crianças carentes, mas preferia estar em coma.

Tigrex.
(O jogo é um RPG de ação, em que você é um caçador de monstros e tem que criar todo o equipamento, planejar a caçada e sair atrás de criaturas que vão de unicórnios a gorilas e dragões gigantes. Com alto grau de detalhismo, você tem até uma fazenda para cultivar ingredientes, tem de se preocupar com o que vai comer antes das expedições; cada monstro em si tem uma personalidade própria, você precisa aprender seus movimentos, suas reações; enfim, é um jogo que exige centenas e centenas de horas de dedicação... Aproveitei bem, tornou-se certamente meu game favorito de todos os tempos; e ainda não terminei.)

(Você vê, essa foi a grande viagem do meu ano...)

Teve também um pulo rápido em Campinas, em debate com Marcelo Maluf, Andrea del Fuego e Luiz Brás



E Campo Grande, com Douglas Diegues e Anelia Pietrani.

As perspectivas para 2017... são as piores. Tem livro novo sim, romance, já entregue, nas prés, ainda sem data para o lançamento. Mas há muito que os livros não mudam nem minha vida, quanto mais o país, a crise, o aquecimento global...


Debate com Raphael Montes e Rogerio Pereira, na Bienal, em agosto. 


Reveillon será em Maresias, onde Murilo agora trabalha. Mas talvez volte antes por aqui. 

Balada Literária, semana passada, com Ricardo Dalai Lima, Jeanne Callegari, Patrício Júnior e Ramon Mello. 

TIREM AS CRIANÇAS DA SALA

(Publicado na Ilustríssima da Folha deste domingo) Do que devemos proteger nossas crianças? Como não ofender quem acredita no pecado? Que ga...