21/09/2016

4ª – LONDRES

Londres, outubro passado. 

Não poderia deixar de ser... Londres teria de estar na lista mesmo que eu não quisesse, eu não queria, ela se obrigou a estar aqui.

Fui pela primeira vez aos 16, fazendo intercâmbio no sul da Inglaterra; naquela época, conheci a capital em breves viagens de fim de semana, em que eu e meus colegas corríamos para aproveitar o tempo na Tower Records ou no Museu da Madame Tussauds.

O tempo passou e nada mudou...

Londres acabou sendo das cidades em que mais passei tempo na vida. Em 2002, vindo de um mochilão, acabei arrumando emprego de barman numa boate e comecei toda uma nova carreira. No Brasil eu já era um publicitário formado, com experiência, em Londres eu era um latino que sabia falar inglês.

Com Laurence, meu colega de bar. 

Comecei a trabalhar como barman sete dias por semana.

Era assim que funcionava, os funcionários do bar marcavam que dias podiam trabalhar; mas eu, como não tinha mais nada a fazer da vida, marcava para trabalhar todos os dias, para poder me  sustentar.

E com a lendária Dusty. 

E funcionava. Porque a maioria dos funcionários era estudantes que tinham outras atividades ou queriam sair à noite. Eu era o latino que estava sempre lá.

Com Simon, do Suede.
Claro, eu tirei algumas folgas, um show do Suede, um show do Sex Gang Children, mas em geral eu estava sempre lá, atrás do bar. Fora atender os clientes, também fiquei várias tardes da semana lá ajudando a receber os caminhões e fazer o estoque. Era divertido. Ser barman tem uma aura, né? Diferentemente de ser garçom, você está protegido por um balcão, as pessoas vão até você, torna-se um certo status dizer que é amigo do barman. Aos 24-25, idade que trabalhei lá, foi bem bacana para mim.

Com meu guitarrista favorito de todos os tempos, Bernard Butler, e David McAlmont. 

O Ghetto se tornou uma boate hypada e marcou história no elektro. Entre seus clientes, passaram Kate Moss, Bjork, Siouxsie, Brian Molko, Boy George...

Mas isso também limitou muito minha experiência de Londres à noite. Quando eu trabalhava lá, dormia quase o dia todo. Acordado de dia, não tinha muito pique para turismo, não tinha muita grana, e também tinha minhas tarefas na casa. Morava com três amigos brasileiros e um inglês num sobrado em White Chapel, na zona leste de Londres, bairro típico de imigrantes. 

Os canais de Camden. 

Naquele esquema, não daria para ficar mais do que alguns meses. Voltei ao Brasil sem arrependimentos, com muita experiência na bagagem. Logo comecei uma nova carreira como tradutor e escritor (meus dois primeiros livros, Olívio e A Morte Sem Nome, foram escritos em Porto Alegre, antes de meu período em Londres, mas publicados depois que voltei a São Paulo).


carregando os caminhões com Rebecca, querida colega do bar. 

Ano passado tive uma breve passagem de quatro dias na cidade, após treze anos longe. Não tinha obrigação alguma e preferi assim. Tinha apenas de esperar o tempo passar até pegar meu vôo de volta ao Brasil. Estava num final de viagem e também sem muito dinheiro, então preferi rever uma Londres de leve.

E revendo a Rebecca ano passado, num barzinho em Camden. 

Reencontrei uma capital muito mais cosmopolita do que eu deixara em 2002. Com um centro e um Soho impressionantes. Apesar de estar com pouca grana e pouca disposição para balada, consegui aproveitar as tardes em Camden, os passeios nos rios, canais e parques. Esse é um ponto crucial que pesa na Londres da minha avaliação: apesar de ser uma metrópole turística, é possível aproveitar programas tranquilos (vazios) e bucólicos pelas paisagens em torno da cidade. Foi isso o que fiz.

Encontrei esse estranho parque ano passado, perto de onde me hospedei em King's Cross. 

O lado selvagem de Londres. 

O triste ano passado foi constatar o fim das lojas de disco; sempre associei muito a cidade à música, minhas bandas favoritas vêm de lá, mas o paraíso de grandes lojas de discos já não existe mais. Claro, não existem em nenhum lugar, mas achei mais fácil encontrar novidades em Paris, que ainda tem as Fnacs com grandes seções de música, do que em Londres. Consegui comprar algumas coisas em lojas pequenas, mas ficou claro que as vendas estão entregues à internet, e que para isso estar na cidade não faz muita diferença.

Hyde Park
 Mas enfim, Londres permanece como a cidade mais importante de todas minhas influências literárias, musicais, artísticas, como a formação de mim mesmo. A breve passagem ano passado me deixou com vontade de mais; é um lugar onde eu poderia ser novamente feliz.




TIREM AS CRIANÇAS DA SALA

(Publicado na Ilustríssima da Folha deste domingo) Do que devemos proteger nossas crianças? Como não ofender quem acredita no pecado? Que ga...