31/08/2012

O QUE ANDA LENDO



Com Carlos Henrique Schroeder, escritor.


Ei, não sentiu falta da minha coluna?

Eu sei que não. Haha.

Mudou a editoria da revista Metáfora, que efetivamente pagava pela coluna lá, minha colaboração ficou incerta, e eu perdi o ânimo de seguir apenas por aqui, ainda mais porque achei que encerrei com chave de ouro com a leitora-confeiteira-piteia-docinho-de-coco Hitomi. Mas faltava a última coluna da revista, que fiz com o grande escritor e agitador cultural catarinense Carloes Henrique Schroeder.

Além de editor, Schroeder organiza o Festival Nacional do Conto, em Jaraguá do Sul, do qual eu participei ano passado. Evento da maior qualidade e de especial importância por haver tão pouca gente fazendo pela literatura em Santa Catarina. É o que eu falo aqui: quem vocês acham que vai levar o escritor para a sua cidade, participar de debates, autografar livros? Schroeder é desses caras, que corre atrás de apoio, patrocínio, se esforça ao máximo para receber os escritores da melhor forma possível. E faz bonito. 

Não dá para ficar esperando que só os Sescs (e muito menos o governo) leve os autores. É preciso que o povo das letras arregace as mangas. 

Eu, como tenho problemas de sociabilidade, faço isso por aqui....



Nazarian: Schroeder, o que anda lendo?

Schroeder:  Estou lendo O Mapa e o Território do Michel Houllebecq, que é sempre um autor visceral, como o Bernhard.

Nazarian: Hum, conheço pouco dele, só li o Partículas Elementares...

Schroeder: Li todos os livros dele, e eu acho que as pessoas têm um birra com ele, só porque ele fala umas verdades. O Brasil impera um bundamolismo oficial, principalmente na literatura. A crítica opera num padrão ultrapassado, do século passado. E muitos autores correm atrás da crítica, então surge um retro-retrocesso. O Houllebecq sempre apontou para o futuro, em seus livros.

Nazarian: É um meio muito restrito, muito fechado, mais burro e preconceituoso do que deveria ser... Onde não há espaço para alternativas. Ou melhor até há, acho que hoje há, mas as alternativas não são aceitas no meio, seguem paralelas. Mas e quanto ao O Mapa e o Território?

Schroeder: Em "O mapa e o território" tudo gira em redor do Jed Martin, um artista plástico amargurado, e suas relações tempestuosas. A ausência do pai, a beleza de uma paixão juvenil, as relações entre arte e dinheiro. A linguagem é crua, bem Houllebecq, e ele aparece como personagem também, de maneira rápida. O grande lance do livro é o questionamento: onde acaba a vida, onde começa a arte, onde acaba a arte, onde começa a vida? E o legal que todos os personagens vivem uma espécie de contemplação, da narrativa, da vida.

Nazarian: Essa coisa da metaficção dele... Isso é o tipo de coisa que não é bem vista com bons olhos aqui... Bem, acho que não é bem vista na França também, né? Ele está longe de ser unanimidade...

Schroeder:  Ele sempre foi muito criticado, e quando ganhou o Goncourt, com esse livro, as coisas pioraram. Ele chegou a ficar um tempo desaparecido, no final do ano passado, ninguém sabia dele. Logo mete um tiro nos miolos, podes apostar.

Nazarian: Escritor bom é escritor morto!

Schroeder: Com certeza, ninguém suporta o sucesso em vida, dói muito. E no Brasil nem se fala... A França não vive um bom momento na literatura, mas tem o Mathias Enard, que escreveu Zona, um puta livro. O Littel, e claro, o Houllebecq.

Nazarian: "Ninguém suporta o sucesso em vida", acho um pouco pesado, Schroeder. Juliana Paes não deve estar pensando em suicídio...

Schroeder: Na literatura, na literatura, e quem não suporto o sucesso são os outros, o detentor do sucesso suporta, é claro. E muito bem.

Nazarian: Eu acho que, para o escritor, talvez seja diferente. É que o máximo de sucesso que o escritor pode alcançar - mesmo na França - é ainda indiferente ao mundo das pessoas reais. É inútil para mudar sua realidade, sua reclusão, sua solidão e as frustrações que o fizeram, de antemão, ser escritor.

Schroeder: Tem um texto muito legal do Manuel Vilas, que pergunta "o que é o sucesso" para um escritor, e os níveis de sucesso. O latino quer sair na Europa, o europeu nos EUA, o americano na Europa e Japão, é muito legal, sobre a portabilidade. Para mim, sucesso é poder ler e escrever.Você está sempre sozinho, sempre, na literatura.

O Mapa e o Território, do francês Michel Houllebecq, foi publicado em português em 2012, pela Record



24/08/2012


PRA LÁ DO PARANÁ


Com a querida Eliane Brum. 


Terminou em sangue e patifarias minhas apresentações nos Sescs pelo Paraná... Nah, longe disso.  Tudo muito civilizado, carinhoso e produtivo.

Eliane tem muito o que dizer. 


“A Nova Geração de Leitores Adolescentes” era o tema das minhas mesas com Eliane Brum. Eu mesmo ainda estou conhecendo essa geração (ou esse mercado); apesar de  eu ter uma boa base de leitores jovens, nunca foram exatamente juvenis, e Eliane está ainda mais distante do tema, com mais experiência em reportagens biográficas. Mas conseguimos nos ater razoavelmente ao tema, analisando as tendências atuais, e relatando nossa própria formação como leitores.

A maior parte da plateia, nas três cidades, era de jovens universitários – além de alguns professores e alguns adolescentes. A maior parte da plateia não conhecia nenhum de nós dois – bacana ver que o tema e a curiosidade sobre escritores ainda motiva pessoas. Porém é sempre mais legal encontrar meus leitores de fato, ouvir as perguntas e opiniões deles sobre o que eu escrevi.


Nossa plateia. 

A primeira apresentação foi em Ponta Grossa, para uma plateia formada basicamente por universitários, já que a apresentação foi transferida do Sesc para uma universidade próxima, por conta de uma greve. Estava bem cheio, mas o povo parecia que estava lá para matar aula, foi meio difícil cativar a plateia. Acho que conseguimos, no final, houve boas perguntas. Da cidade, não conheci quase nada.

Turista em Guarapuava. 


O segundo dia foi em Guarapuava, que eu achei de longe o melhor debate. A linda sala do Sesc estava lotada, o povo parecia realmente interessado e foi o bate-papo mais divertido e produtivo, com gente da plateia perguntando, opinando, discordando. Também consegui dar algumas entrevistas, caminhar um pouco pela cidade, pelo lago, a lagoa. Achei bem bonito.

O curador Luis Henrique Pellanda, eu, Luci Collin (mediadora em Curitiba) e Eliane.  


Curitiba foi a pior apresentação das três. Estava cheio, mas a sala não era lá muito grande – umas sessenta pessoas, o menor público dessa turnê. Esperava alguns amigos, que não apareceram. Achei o clima tenso, tudo sério demais, e farpas foram trocadas. Sinceramente, eu achei que ninguém lá estava interessado no que eu tinha para falar, e isso foi especialmente desmotivador por eu estar falando basicamente as mesmas coisas no terceiro dia seguido. Só percebi que havia leitores MEUS realmente por lá, depois que a mesa acabou, que vieram vários queridíssimos com livros para eu autografar. Isso fez valer.


Guarapuava. 

E no geral, valeu demais. Tirando as viagens, essa experiência de se apresentar com a mesma pessoa (Eliane Brum), discutindo os mesmos temas com diferentes públicos é muito proveitosa. É uma experiência próxima a uma apresentação teatral, em que cada dia o público reage diferente, dá um ritmo diferente. Eu não pude deixar de repetir piadinhas nos três dias – que funcionavam mais ou menos, dependendo da cidade.

Na estrada. 


Eu não conhecia a Eliane Brum, e foi uma companhia riquíssima. As discussões se prolongavam pela van nas viagens e nos jantares. É uma pessoa de uma sensibilidade absurda, e com alguns pontos discordantes comigo, vitais para um bom debate. Pessoalmente, eu acho debates literários um saco. Quero dizer, não consigo assistir. Sou hiperativo e não consigo focar, geralmente desligo nos primeiros cinco minutos. (Bem, eu nunca gostei de aula, de palestra, de ver gente falando...) Como debatedor, eu procuro sempre rebater para a plateia, fazê-la se lembrar que eu sei que eles estão lá, seja com piadinhas, seja com provocações ou perguntas. Nem sempre dá certo. A química com a outra pessoa da mesa é essencial, tem de haver uma troca e uma sintonia. A Eliane, particularmente, tem um tom bem diferente do meu, e tivemos de encontrar um equilíbrio que desse certo. Por isso os três dias juntos foram especialmente proveitosos. Vou ficar com saudades.

Entrevista para a filial da Globo no interior do Paraná. 


Lembro em especial de uma conversa que tivemos na van, de uma cidade para outra, falando sobre as dificuldades, o mercado, a importância de premiações e seleções e divulgações... Eliana me solta: "O importante mesmo é se divertir." Uma colocação óbvia, mas que tantas vezes é esquecida. Eu mesmo já me esqueci de que escrever costumava ser uma diversão para mim. Não tem sido, confesso. 

 A meninada em Guarapuava. 


O pessoal todo do Sesc, das cidades que fomos, nos hotéis foi muito atencioso e acolhedor. O Sesc organiza esses eventos como ninguém (e paga os autores, o que é muito importante). É nosso Ministério da Cultura paralelo, fazendo pela literatura o que o governo negligencia. Triste ver que um projeto como o Autores & Ideias (esse) está ameaçado, já que o governo está cobrando que o Sesc aumente a verba destinada à educação formal (já que o governo não dá conta), tendo de diminuir a verba para cultura.



 Olha só, em Ponta Grossa tinha até OLÍVIO, meu primeiro, para vender.


Quanto ao lançamento do Garotos Malditos basicamente não houve. Os livros que assinei nessas três cidades foram os anteriores, que leitores trouxeram de casa. O público que assistiu não era o público do livro (já haviam passado da idade de se interessar por um livro juvenil e ainda estavam longe de terem filhos adolescentes). Alguns compraram O Prédio, o Tédio e o Menino Cego e Pornofantasma, que também estavam à venda. O mais lindinho foi uma mãe em Guarapuava que estava com a filha de onze anos e veio com Garotos Malditos para eu assinar. “Minha filha ficou louca pelo seu livro.” “É... acho que já dá para ela ler...” eu disse com certo receio. E a mãe: “Dá sim, claro que dá.” Então tudo certo.

Ainda não sei bem como chegar nesse público (13-16 anos), como promover esse livro. É bom que a RECORD saiba...
 As meninas fizeram a diferença. 

Fico pensando também em quantos livros distribuí (deste e dos anteriores), para amigos, organizadores de eventos, “formadores de opinião”. É tão triste pensar que muitos desses livros foram basicamente engavetados. É um pouco contraditório, porque eu sou daqueles que não empresta livro, que não repassa livro, recebo pilhas e mais pilhas, que não dou conta de ler, mas eles ficam lá na minha casa. Mas com os meus próprios, preferiria que fossem repassados. Preferia que se a pessoa não fosse ler, que desse para alguém que pudesse se interessar, especialmente o Garotos Malditos, que é para um público específico.

Agora estico o final de semana aqui no sul. Florianópolis, claro. (Nada marcado por aqui – o maior problema da Ilha, você sabe, é que praticamente não há vida cultural. E transporte público. É, o maior problema da ilha é mesmo a falta de transporte.)



Agora é tentar trazer o sol de volta em minha vida. 



17/08/2012

AO PARANÁ E ALÉM...




Semana que vem faço uma pequena turnê no Paraná, à convite do Sesc, debatendo sobre literatura juvenil com Eliane Brum e em seguida autografando Garotos Malditos. Muito bacana porque não conheço Ponta Grossa (sem trocadalhos) nem Guarapuava e faz ANOS que não vou a Curitiba. Estava devendo um lançamento lá.

E pessoas perguntam "e no Rio?" "Porto Alegre?" "Recife?" É o que eu SEMPRE falo, cabe a VOCÊS organizarem, proporem, convidarem. Eu vivo da escrita, não tenho nenhum outro trabalho para bater cartão, então estou sempre disposto a viajar; eu GOSTO de viajar de encontrar leitores, mas tem de ter algum evento, passagem, hospedagem, cachezin...

- Sim, músico ganha para fazer show, mesmo que esteja divulgando seu CD. Escritor também tem de ganhar para fazer palestra/debate. Escritor também come.

- Não, a Editora raramente paga passagem e hospedagem para o autor divulgar o livro em outras cidades. É como esperar que a gravadora pagasse para o músico fazer show, em vez da produtora que o contrata.

- Não, evento não é uma NOITE DE AUTÓGRAFOS numa livraria de uma cidadezinha. Noite de Autógrafos só rende mesmo em lugares onde o autor tem muitos amigos, familiares. As pessoas só lotam uma livraria para pegar um autógrafo de um escritor se ele for MUITO conhecido, tipo bestseller, ou se elas forem amigas. Um evento como um debate ou palestra já atrai um pouco mais - se for bem divulgado e bem pensado - pela curiosidade. Não há o compromisso de comprar e elas podem conhecer um pouco mais o autor, saber o que ele tem a dizer.

- QUEM organiza esse eventos? Vocês. Leitores, amigos, gente que gosta desses livros e vai atrás de patrocínio, apoio, ou indica meu nome em eventos que já estão sendo organizados por outras pessoas.

Sério, é muito mais fácil você saber o que está acontecendo e ter contatos na sua cidade do que eu conseguir ir atrás da organização da Feira do Livro de Garanhuns. A Editora também -infelizmente - tem um alcance bem limitado - e não costuma trabalhar a carreira do autor, só o livro.

Digo tudo isso porque tenho viajado muito menos do que eu poderia, porque as pessoas sempre cobram, mas nunca propõem. Não há carreira mais solo do que a de um escritor. Estou sempre sozinho, ninguém está trabalhando minha carreira, ninguém está me arrumando esses eventos, sou apenas eu. A editora só cuida da venda e distribuição do livro. Tenho uma agente internacional que cuida das coisas lá fora - fora do Brasil. Aqui só tenho mesmo meus leitores e minha própria força de vontade... que admito que já foi bem maior.

Para um escritor de médio porte se manter rentável (ou pagar as contas) tem de ser assim, não dá para contratar assessoria, não dá para ter funcionários. Eu não tenho nem esposa, nem namorado e estou sem faxineira. Então não posso contar com ninguém mesmo.

Quando falo de cachezin e muitas vezes é cacheZIN, coisa pouca, só para eu não gastar mais saindo de casa, pegando táxi para aeroporto, comendo fora. E estou de saco cheio também de ficar recebendo spam no meu email de festa literária na puta que pariu. Se têm meu email para mandar a programação, tinham meu email para me convidar para participar.

Esta semana mesmo recebi um email do LONDRIX, festival literário em Londrina, bem quando vou estar no Paraná. NUNCA me chamaram para essa bagaça. Por que me mandam a programação? Vou estar no Paraná até, podiam ter economizado bem em passagem e me colocado numa mesa.

Enfim, o recado está dado.

E o resto é só amor.


7 filhos. Muito orgulho. 

15/08/2012

SAINDO DE CENA...



Leonardo Miggiorin em Equus. 


Das boas coisas de São Paulo é ter tanta oferta cultural, tanta coisa para fazer, inesgotáveis espetáculos, horários e opções. O velho chavão é dizer que "tem tanta coisa para a gente ver, mas a gente acaba não vendo nada" - e entendo que fica difícil para quem passa o dia fora de casa, no trânsito, chega de noite em casa para descansar (ou ver novela). Eu, como escritor ocioso, procuro sempre ver o que está passando. Como semana passada, em que vi 3 espetáculos. 




Na quinta teve a estreia de Mormaço, de Ricardo Inham, com o querido Laerte Késsimos. É um espetáculo denso e pesado de amor e violência, em três núcleos de atores. Vai até o final do mês, na Barra Funda, sextas, sábados, domingos e segundas (um ótimo dia extra para a classe teatral também poder prestigiar). 





Sexta vi no Parlapatões o Serpente Verde Sabor Maçã, de Jô Billac e Larissa Câmara. É uma comédia de humor negro gótico-kitsch com elenco todo excepcional, coisa total Tim Burton, que tenho certeza de que muitos amigos vão gostar. Eu amei. E fica em cartaz também só até o final do mês (quintas e sextas, 21h). 

Sábado teve o Equus, do inglês Peter Shaffer, com Leonardo Miggiorin, Elias Andreato e mais uma pá, no Teatro Folha. Tem uma carga homoerótica forte na história de obsessão de um menino por cavalos, o texto tem várias passagens preciosas e os atores também estão todos ótimos. Só me me assusta um pouco que no Teatro Folha as pessoas podem comer bala e PIPOCA no meio do espetáculo... Mas enfim. Este final de semana é o último de Equus  por lá. 



E este também é o último final de semana de Adeus À Carne, do muso Michel Melamed. Ele construiu uma peça-laboratório deliciosa de assistir. Uma coisa meio jogo, mas sem interatividade (thank god!) da plateia. Fui há algumas semanas, na estreia, e quero ver de novo. 



E no final do mês termina também a temporada de Feriado de Mim Mesmo, do Teatro de Extremos, baseado no meu texto, no Armazém XIX, no Belém, em SP. A montagem é deles, mas eu gosto bem-bem. Vai para outras cidades? Vai continuar em São Paulo? Vai estrear em outros lugares mais próximos? Bem por que VOCÊ não vem com uma proposta, um convite?

13/08/2012

ENTREVISTA PARA O SITE CABINE LITERÁRIA



Ontem, na Bienal. 

12/08/2012

MALDITOS, FANTÁSTICOS E OBSCUROS

Martha Argel, André Vianco, Santiago Nazarian, Sarah Backley Catwright e Giulia Moon, hoje na Bienal.


"Vampiros e Lobisomens à Solta." Era esse o tema de minha mesa hoje na Bienal do Livro de São Paulo, com autores mais do que conhecidos neste filão. Eu entrei de penetra. Embora não abraçado totalmente pelo meio literário dito "sério", nunca cheguei a fazer parte e ser conhecido como um autor de gênero, de terror. Coisas como Pornofantasma e Mastigando Humanos flertam bem com o fantástico (e TODOS os meus livros ficam num universo trevoso), mas eu não poderia categorizá-los como livros de gênero, e fico feliz que nunca ficaram restritos a isso.


A mesa. 


Mas gostei bem do convite para a mesa de hoje, porque Garotos Malditos, meu primeiro livro juvenil, é certamente o mais focado nessa direção, e busca um público específico que talvez ainda não me conheça muito bem (e certamente conhece os outros autores). 


É Nazarian "se vendendo"? Talvez, de certo modo. Fiz o livro pensando num mercado - recebi uma grana da Petrobras para escrever, antes de tudo - mas fiz da forma que acredito, dentro do que sempre gostei, respeitando meus princípios e minha ideologia. (Feio seria se eu estivesse escrevendo novela de TV, participando de reality ou dando oficinas literárias, coisas de que não gosto e nunca acreditei.)

Foi também um desafio importante para minha formação como escritor, fazer um livro sob encomenda, pensando num público específico. Exigiu um novo talento e muito trabalho. Acho fundamental que o o autor profissional se coloque desafios assim. 


"Não dá para ficar sem mesa de vampiro," disse à Folha Zeca Camargo (isso, apresentador do Fantástico), curador do espaço jovem da Bienal, que me convidou para a mesa. E tanto nas declarações dele como no próprio debate nota-se o incômodo provocado pela "literatura comercial", uma certa mágoa (compreensível) dos autores que vendem muito mas são "congelados pela crítica" - como diz o próprio subtítulo da antologia Geração Subzero.

O caso de Geração Subzero é curioso, porque focou-se em autores comerciais, gente que vende horrores (como Vianco, Spohr e Thalita Rebouças), mas o título faz referência a Geração Zero Zero, antologia organizada pelo Nelson de Oliveira com os "melhores autores surgidos neste século", autores que vendem infinitamente menos, muitos dos quais são notórios desconhecidos. Reforçando a ironia, Subzero foi lançado por uma editora bem maior (Record) e teve muito mais repercussão do que o Geração Zero Zero, mas a mágoa (ou a provocação) está impressa eternamente em seu título. 




Então o debate de hoje não ficou só nos vampiros. A mágoa estava lá, não só do desprezo da crítica pelo gênero fantástico, mas pela falta de espaço no Brasil para essa produção em geral - em filmes, TV, debates, etc. Digo, no Brasil, mas a americana Sarah Blackey Catwright também deixou escapar um ressentimento em relação a como a crítica literária vê os gêneros fantásticos, isso num país com tradição cultural nessa área, como os EUA.

Claro que nem tudo foi amargura. Afinal, em graus e formas diferentes, pode se dizer que os cinco autores da mesa são bem-sucedidos (eu quero acreditar! Deixe-me acreditar!). Então também se falou muito sobre vampiros, lobisomens, construção de narrativas, dicas para quem quer escrever/publicar (claro), livros de cabeceira, autores de formação e nossas inspirações. Estava lotado, lotado de uma petizada. Foi divertido, engraçado - e obviamente eu procurava sempre pontuar a discussão com tiradinhas. O povo riu bem. Achei que a Sarah - autora de A Garota da Capa Vermelha - que fosse arrastar o grande público, mas me parece que todos eram mesmo fãs do Vianco.




Meus três bebês com a Record. 

Dos meus leitores, pouquíssimos. Eu não esperava mesmo - domingo, de manhã, com a desculpa do dia dos pais. Mas a mesa era para isso, buscar novos públicos, ampliar um pouco meu alcance. Lindinho ter várias meninas pedindo para tirar foto comigo depois do debate (meninas que com certeza nunca tinham ouvido falar de mim). E um garoto me levou balas de gelatina em formato de minhoca - prova de que leu muito bem Pornofantasma. 

Todo o pessoal da mesa foi muito bacana. Maria Tereza Arruda Campos mediou muito bem - éramos 5 pessoas afinal, achei que não ia render nada, mas todo mundo falou bem, trocou ideias, discutiu e ainda se abriu espaço para perguntas do público. Eu já conhecia a Martha e Giulia por alto, são queridíssimas e fazem parte da cena gótica paulistana - agora preciso ler mais as duas. Vianco eu conheci hoje, e me pareceu muito gente boa. E pela Sarah eu quase me apaixonei...

Curioso foi notar que a figura do popstar não faz mesmo sentido na literatura. Sarah e Vianco, que são bestsellers, estavam vestidos completamente "a passeio", longe de encarnar visualmente o que escrevem. Ninguém vestia o personagem vampi... Bem, talvez EU fosse o mais próximo disso, mas o que posso fazer, é assim que eu sou...



O querido Arthur Spada, marido da leitora perfeita -Hitomi - não só prestigiou como tirou a maior parte das fotos deste post. 



Encerrando minha participação no debate, não pude deixar de assinalar a diferença. O grande clichê do autor de gênero é dizer que "não existe isso de literatura de gênero, é tudo literatura." Eu não concordo. Disse isso publicamente. Literatura de terror pode transcender o gênero e ser tornar Literatura, mas geralmente não é o que acontece. Geralmente o livro de terror cumpre a função de entreter, assustar, contar uma boa história - e só. Não inova na linguagem, não trabalha a construção poética, não provoca a reflexão profunda - enfim, não é Literatura. Já fiz Literatura com o universo adolescente, em O Prédio, o Tédio e o Menino Cego, acredito. Garotos Malditos é literatura juvenil NÃO é literatura. 

E acho que a literatura de entretenimento pode ser inteligente, ousada, provocativa, engraçada - acima de tudo, engraçada - é o que procurei fazer. É o caminho desse livro. Não estou desistindo da Literatura. Meu próximo romance será Literário, adulto... ou quase. (Só em 2014...)

Ajudaria a diminuir o preconceito da intelligentsia com a literatura de entretenimento se seus autores realmente fossem mais engraçados, inteligentes, não se levassem tanto a sério e não dessem declarações sofríveis como a que Raphael Draccon - autor bestseller de livros de dragões e agora editor - deu à Folha de ontem: 

"Queremos livros diferentes do tradicional, mas que tenham apelo comercial, e, principalmente, queremos saber da índole do autor, tem que ter ficha limpa, analisamos seu histórico antes de decidir publicá-lo."

WT? Sinceramente, a declaração mais pau-no-cu que já li de um escritor. 


Achei a Sarah uma graça, uma graça. Fofíssima.


08/08/2012

É DOMINGO AGORA...



(clica que amplia)

Lançamento do meu juvenil, Garotos Malditos, contemplado no programa Petrobras Cultural, lançado pela  Galera, selo juvenil da Record.

11h da manhã de um domingo é foda, mas o debate com André Vianco, Martha Argel, Giulia Moon e Sarah Bakley Catwright (autora de A Garota da Capa Vermelha) certamente vai atrair um público (embora eu não saiba se é o MEU público). Os autógrafos são em seguida, no estande da Record (sim, será ESSE o lançamento em São Paulo, não haverá noite de autógrafos em livraria).

Garotos Malditos foca num público diferente, mais jovem e talvez menos literário do que meus livros "adultos". Gostei do convite para essa mesa especialmente por estar bem dentro do tema do livro, e por me aproximar de autores de gênero, um mercado que eu não conheço muito bem. Talvez fosse mais bacana se eu pudesse mediar a mesa, porque mais quero entender o trabalho desses autores do que falar sobre o meu.

André Vianco, por exemplo, com seus livros de vampiros, já vendeu mais de 700 mil exemplares no Brasil. Como os livros dele ainda não viraram filme, seriado, como fica a venda de direitos para fora do país? Acho  Os Sete (o grande bestseller dele) bem divertido. O cara se propôs a escrever um livro de terror brasileiro ambicioso, fez a lição de casa, não ultrapassa o gênero mas entrega muito bem o que promete.

Garotos Malditos não chega a ser um livro "de terror", é um juvenil carregado de humor-negro, recheado de referências a filmes de terror, mais para rir do que para assustar. Vamos ver no que dá...





05/08/2012

INVASOR DE MIM MESMO


Voyeur de mim, mesmo, assistindo a um espetáculo por uma fenda...


Hoje teve a estreia do espetáculo Feriado de Mim Mesmo aqui em São Paulo (ou próximo). Um espaço distante, difícil, não esperava que os amigos fossem mesmo, nem fiz força nem pressão. Já falei disso aqui há alguns anos, sobre os "mendigos culturais", essa coisa de escritor, ator de teatro, ficar mendigando público, implorando para que as pessoas assistam, leiam, comprem, compareçam. Os amigos prestando um favor, felizes quando têm uma boa desculpa para não ir - "vou viajar", "tenho aula nesse horário", "meu cachorro ficou  doente"...

Então divulguei aqui no blog e no FB, chamei os que gostam de teatro, ninguém quis ir. Eu tive uma semana   emocionalmente pesada (bem, meu dia-a-dia tem sido emocionalmente pesado - sinto atualmente que abrir um vidro de maionese já me requer uma preparação emocional - ah-ha) e não sabia bem se eu ia. Fui. Sozinho. Peguei metrô. Peguei táxi. Cheguei no Armazém XIX, local da peça, quinze minutos antes de começar, ou era o que eu achava...

Leia com muita atenção os detalhes do flyer.


20:45 eu estava do lado de fora de um casarão, numa vila totalmente deserta, no Belém, que parecia outra cidade, uma cidade fantasma, escutando ecos de mim mesmo (no passado). O Armazém fica numa vila fechada, então não há carros, não há pessoas, não há nada (pelo menos as 20:45 de um sábado). E eu fiquei contornando aquela casa, ouvindo aquelas vozes, percebendo aos poucos que eu estava escutando o meu próprio texto...

Ligou o aparelho de som para que preenchesse a casa. Sentou-se na frente do computador para mais uma vez vasculhar seus arquivos. A tradução de um livro. Um livro infantil. A história de um grilo - um grilo não - uma cigarra, uma cigarra e uma formiga. Já não a lera em algum lugar? 

Será que estão ensaiando a peça? Passando o som? Poucos minutos antes da estreia? Contornei todo o armazém/casarão e não encontrei nenhuma entrada, nenhum bilheteiro. Nos fundos, uma porta encostada. Entrei. Um salão escuro. Roupas. Um sofá com uma caixa de pizza. Me sentei e liguei o Iphone. Verifiquei. A peça começava às 20h. Eu jurava que começava às 21h (como toda peça aos sábados). Já havia começado há um bom tempo. Eu errei de horário.

Sei que foi das experiências mais surreais, chegar até um casarão no Belém, entrar escondido pelos fundos, e ficar lá, sozinho, no escuro, ouvindo meu próprio texto na boca de atores que estavam sei lá onde. Em determinado momento, uma porta interna se abriu, os atores voltaram ao camarim para buscar a pizza...


Estava com fome. Chamou uma pizza. Não queria correr o risco de ingerir seu próprio veneno. Do jeito que as coisas estavam, cada gole era fatal, cada passo, em falso. Olhou para si mesmo e notou um sorriso diferente. Olhava para si mesmo e notava um sorriso que não deveria estar lá. Cínico. Como seu próprio eu desafiando-o para um duelo. Não poderia ser. Não poderia ser tudo uma alucinação. Não poderia ser ele mesmo o invasor de seu cotidiano.

Foi um momento mágico. Haha. Os atores vieram até o sofá buscar a caixa de pizza da cena, e eu estava lá, de preto (claro), sentado no escuro. Um deles deu um grito. Eu me desculpei, tentei explicar rapidamente porque havia chegado atrasado, eles pegaram a caixa e voltaram em cena. Deixaram uma porta da coxia semi-aberta para eu poder espiar (de onde tirei a foto acima). E por lá meio que assisti o terço final da peça.


Quebro em caquinhos, acerto meu próprio rosto. Me quebro em pedaços e não sinto dor alguma. Cato os pedaços com minhas próprias mãos. Vejo minhas mãos segurando o espelho. Em cacos, eu escorro... 

Enfim, foi daqueles momentos mágicos. Terminou a peça, os atores me chamaram ao palco e eu vi que havia um bom público e que havia alguns (poucos, raros) amigos. Eu já vi o espetáculo inteiro convencionalmente no Rio de Janeiro, gostei muito, já comentei muito aqui, então para mim foi especial e inesquecível ter visto dessa forma.

E comento sem pudor: O Feriado de Mim Mesmo que o Fabiano de Freitas e sua trupe fizeram está muito longe do que eu imaginava. Você sabe, no meu mundo, todos os rapazes são andróginos. Na primeira vez que vi as fotos de divulgação com esses barbudos, pensei: "Que porra é essa?" Acontece que a beleza está aí. Se fosse eu a levar esse texto para o teatro, se materializaria numa coisa falsa, fake, poser, artificial. Um livro permite leituras e visualizações diferentes a quem lê. Esses meninos deram a visão deles do meu texto, com tamanha honestidade e talento que eu pude me maravilhar vendo projetada uma visão que eu jamais teria dessa obra. É uma experiência rara de um autor vendo como um leitor apaixonado visualiza seu livro. Lindo.

Acho que agora eu tenho mesmo de espiar sempre por uma fenda, entrando pelos fundos...


Com Daniel e Mariana, após os aplausos. 

TIREM AS CRIANÇAS DA SALA

(Publicado na Ilustríssima da Folha deste domingo) Do que devemos proteger nossas crianças? Como não ofender quem acredita no pecado? Que ga...