27/07/2012


FELICIDADE (IN)SUSTENTÁVEL


Não há razão para a felicidade. Tampouco justificativa para o sofrimento. Eu sei bem disso. Da mesma forma que é alienação lamentar-se sem grandes dramas na vida, é alienado achar a vida sempre linda, quando a condição humana é tão difícil. Todo mundo tem motivos para sofrer, e todo mundo pode encontrar razões para ser feliz. O solitário que reclama de falta de amor pode ser alienado diante daquele que perdeu a família num massacre. Quem perdeu o braço num acidente pode se considerar mais infeliz do que quem perdeu a visão para sempre? Falta de dinheiro para pagar as contas não é nada, diante de quem está sequestrado. Então os positivos podem sempre olhar o copo meio cheio, os negativos meio vazio.

Mas otimismo e pessimismo não dependem só de nós. Eu acho. Otimismo e pessimismo são uma questão química. Coisas prazerosas, fatos positivos despertam a química do cérebro que nos faz sentir bem. Fracassos e perdas derrubam o nosso ânimo. E um desequilíbrio químico pode nos fazer incapazes de olhar o lado bom, a química certa pode nos causar uma euforia e um prazer sem limites.

Sei bem disso. E acho que sabe bem quem já botou muito o pé na jaca, como eu. Drogas como o Ecstasy – que eu tomava como se fosse Halls, dez anos atrás – podem te dar um prazer incomparável, e você encontra motivos: é a música que toca, são seus amigos, são tantas coisas boas que a vida ainda reserva para você. E drogas como o Ecstasy podem te dar as piores paranoias: é a festa que acaba, um amor que você sabe que vai embora, a certeza de que nunca mais você terá uma noite tão boa como aquela.

Eu nunca tive momentos de felicidade tão intensos como aqueles que experimentei quimicamente alterado. Mas depois disso nunca consegui ver felicidade e sofrimento da mesma maneira. Hoje me parece que tristeza e felicidade são apenas um jogo, um jogo de química. Ressaca, do que seja, me faz acordar só pensando em suicídio. Um pouco de álcool deixa tudo mais divertido. Falta de cafeína me deixa cansado, cafeína demais me torna irascível. Eu tento cada vez mais fugir desse jogo da química. Escapar completamente é impossível.

Focar no trabalho, praticar esportes intensamente na natureza, são coisas que me ajudam naturalmente a ser mais feliz. Dezenas de amigos vivem à base de tarja preta, e recomendam, deve ser mais fácil, mas eu não confio. Sou um ser obsessivo e sei que, se usar essa muleta, nunca mais caminharei sozinho. Já conheço bem o poder da química. Felizmente tenho uma determinação sobre-humana e consegui abrir mão de tudo o que me fazia insustentavelmente feliz. Felizmente tenho uma determinação sobre-humana e nunca me deixei viciar pelo que iria me destruir...

Tenho me sentido um domador de mim mesmo, ou dos meus sentimentos, me esforçando diariamente para manter tudo sob controle. Abrindo mão de grandes euforias para não precisar suportar a crise do dia seguinte. Até porque, hoje em dia nenhuma euforia é maior do que as crises. Talvez sejam sequelas das drogas, quem sabe,  talvez seja apenas a idade, a vida. O peso da perda é maior do que o da conquista. Ou talvez seja apenas meu olhar alienado, mimado, negativo...

Mas se me lembro bem da infância... Mas me lembro bem da infância, e me lembro o quanto eu achava a vida terrível. O negativismo foi algo que nasceu comigo. 

Fora isso, está tudo lindo. 

TIREM AS CRIANÇAS DA SALA

(Publicado na Ilustríssima da Folha deste domingo) Do que devemos proteger nossas crianças? Como não ofender quem acredita no pecado? Que ga...