11/02/2011

SANGUE DE NITROGÊNIO Essa poderia ser a última foto de um jovem escritor... caminhando para a decrepitude.


Eu falo que é uma missão impossível ser intelectual, atleta e junkie ao mesmo tempo. Mas eu continuo tentando...


Preparando o meu naufrágio.

Intelectual é o que cobram de um escritor, que muitas vezes é confundido com o acadêmico, ou o cronista, ou o jornalista – que não só tem de se nutrir de alta cultura, mas que tem de ter uma opinião reveladora sobre tudo. Junkie é muitas vezes o nicho em que me encontro, nem tanto pelo consumo de substâncias ilícitas, mas principalmente pelo consumo de... junk – sejam balas em formato de minhoca, sejam filmes de piranhas assassinas. E atleta é o que me imponho pela vaidade e hiperatividade. Trabalho em casa, sou hiperativo, e se não me lanço, me canso e desando. A vaidade também serve como equilíbrio, para eu não me acabar de junkie nem virar um intelectual barbudo. A vaidade é que salva minha vida.



Enfim...


Quando vim morar na praia...


Quando vim morar na praia desequilibrei a balança para o lado do atleta é verdade. Aqui não tem cinema, não tem teatro, e eu tenho vivido mais de fotossíntese do que de cultura. Mas não posso enganar ninguém. Por mais que eu corra na praia e malhe todos os dias, por mais que eu pratique kite surf e caminhe por horas e horas, eu sempre vou ter algo de desengonçado, de errado, de patoso, de escritor...


Então eu decidi mergulhar.



André, meu instrutor.


Fiz esta semana inteira um curso intensivo de scuba diver – mergulho com cilindro. Em teoria, para mergulhar com cilindro de ar comprimido, você precisa estar credenciado. A não ser que mergulhe rasinho, com instrutor, etc, etc. Você sabe como eu gosto dos bichinhos... E como gosto de ampliar os horizontes. Então resolvi ampliar meu habitat de exploração vendo os bichinhos dentro d'água. Resolvi virar mergulhador. Não foi tão suave como eu pensava.


O curso começa com um dia inteiro de aulas teóricas. Bem teóricas. Para aprender não apenas quais são os equipamentos necessários, mas calcular a quantidade de Nitrogênio Residual no seu sangue (!) depois dos mergulhos, usar tabelas de tempos e profundidades máximas, procedimentos de emergência, etc. Beleza. Meio que me perdi nos números. Mas beleza. Foi o mais tranquilo.


A primeira aula prática é numa piscina. Tranquilo. Até divertido. Mas só deixa você ansioso para os mergulhos. E os mergulhos...


Pronto para embarcar...


Fiz 4 mergulhos. 2 em cada dia. O primeiro dia foi razoavelmente tranquilo, ainda que meio decepcionante. Visibilidade péssima, poucos peixes, água geladíssima. Fomos de barco até a Ilha do Xavier. Era mais para praticar exercícios. Ok. Deu tudo certo. Foi interessante. Grandes expectativas para o último dia de mergulho.

Já que íamos voltar para a Ilha do Xavier, vesti meu uniforme de X-man, que comprei pra kite (e serviu belíssimo para mergulho, devo dizer) e me alonguei para os últimos mergulhos.




Ainda todo coquete - adoro essas wetsuits. Eu andaria no baixo augusta com essas wetsuits. Quando eu for rico, vou fazer coleção de wet suits. Mas... quando eu for rico, não vou caber mais.

A petizada que mergulhou comigo.


Os últimos 2 mergulhos... Foram traumáticos. O mar estava muito agitado, visibilidade péssima e eu, que sou todo patoso, quase me afoguei enrolado nas alças do meu próprio equipamento. Sério! Fiz umas coisas do tipo... descer doze metros de profundidade com o SNORKEL na boca (isso, snorkel, cheio d'água, sem o ar comprimido do cilindro) e lá embaixo me lembrar de colocar o regulador, esquecer de inflar o colete na superfície e ficar lutando para não afundar. E para coroar... me perdi. De todo mundo. A visibilidade estava péssima, não consegui ver mais ninguém e acabei voltando para o barco.


Só me restou bronzear.


Consegue ler na boca do povo? ("Ts, ts")


Por pouco que não sou credenciado.


Santiago tem fé.


Mas EU FUI credenciado porque fiquei cool – acho que os instrutores ficaram com mais medo do que eu - consegui fazer todos os exercícios, que incluíam coisas como instrutor tirar sua máscara embaixo d'água e você ter de colocar de volta e tirar a água (soprando ar pelo nariz); instrutor fechar sua torneira de ar e você ter de pegar ar do parceiro; você ter de tirar seu EQUIPAMENTO TODO embaixo d'água e vestir de volta...



Depois ainda tinha uma prova escrita teórica. Que eu quase gabaritei, embora estivesse mega, mega tonto desse nitrogênio residual no sangue.

E você me pergunta: e os peixes? E os bichinhos? Bem, a parte GOSTOSA eu não conheci. Hahah. Foi só sofrimento. Sério. Não me arrependi de fazer o curso, é bem interessante, repertório e pré-requisito para viagens mais suaves; mas eu ingenuamente achava que o curso de mergulho ia ser tartarugas comendo na minha mão.

Bem...

Quando eu era criança pequena em Barbacema, e em Ilha Bela, eu mergulhava (de snorkel) na casa do meu tio. E era lindo. Lembro que pegávamos lagostas e meu primo comia as ovas com o bicho ainda vivo. Acho que ele é que acabou com as lagostas na costa brasileira. Agora é preciso afundar mais.


No mais, além de todo o conhecimento da área, o curso ainda me deixou com... sotaque de catarina. Passei um ano nesta ilha incólume, principalmente porque não convivo com ninguém; mas uma semana conversando com a petizada mané e já me percebi cantando hoje no final do dia.


Poderia ser pior. Eu poderia mesmo ter morrido.


É salgado morrer no mar. Agora eu sei.


Game Over, paulista.

TIREM AS CRIANÇAS DA SALA

(Publicado na Ilustríssima da Folha deste domingo) Do que devemos proteger nossas crianças? Como não ofender quem acredita no pecado? Que ga...